terça-feira, agosto 28, 2007

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Fiquei sentado à beira da cama até ter a certeza que tinha adormecido.
Enquanto se enroscava nos lençóis com uma inocente e delicada expressão de felicidade, levantei-me e saí em bicos de pés. Não podia estragar o momento...

Encostei a porta atrás de mim, dirigi-me à secretária, movimentei uma pilha de papéis com o maior dos cuidados, para não fazer barulho. Voltei a pegar no livro.

Outra vez aquela sensação... Que livro estranho.

Abri onde o tinha deixado. Estava tudo na mesma, com aquele estranho texto que me tinha escapado da primeira vez.

"Olhei mas não vi... só pode ter sido isso..." - pensei para mim, tentando justificar.

Virei a página. Mais texto...

7.º, 09 de Abril de 2007, 18:01
... dou por mim a fazer as coisas mais banais como se me estivesses sempre a observar.

8.º, 09 de Abril de 2007, 19:48
... cada vez que aquele telemóvel vibra, pareço um puto a correr para ir desembrulhar prendas no natal.

9.º, 10 de Abril de 2007, 12:28
... às vezes me cheira a ti. Um aroma vindo do nada, mas que vale tanto...

10.º, 10 de Abril de 2007, 18:44
... quando tenho fome, penso em comer-te.

11.º, 16 de Abril de 2007, 08:08
... pode haver pessoas bonitas... mas tu és linda.

12.º, 16 de Abril de 2007, 23:58
... tudo o que seja mais do que 10 metros entre nós já é demasiado longe para ser confortável.

13.º, 18 de Abril de 2007, 04:20
... tens a boca mais bonita que alguma vez vi.

14.º, 19 de Abril de 2007, 20:00
... outrora foste apenas notas soltas. Agora és melodia.

15.º, 19 de Abril de 2007, 21:30
... me mudaste.


Senti a presença de alguém... apressei-me a fechar o livro.

"Pssst... volta p'rá cama..."

A sua voz ensonada teve um efeito magnético.


Enquanto me deslocava de volta para o quarto, mil hipóteses competiam desenfreadamente para explicar aquele livro... Com aqueles textos... Tantos anos depois...

Sabores, I

Hoje sabes a...

... ananás.
(sei que fico com aftas e que vai doer... mas não consigo evitar comer)

sábado, agosto 18, 2007

Capítulo 1

Estava calmamente sentado à secretária num típico dia de trabalho, quando voltei a sentir aquela sensação estranha. Olhei ligeiramente para a direita e lá estava ele, por entre papelada e inutilidades das quais as secretárias estão sempre cheias.

Peguei-lhe. Estava diferente, parecia mais pesado embora pesasse exactamente o mesmo desde a última vez. Bom, na verdade pesava menos, tal era a quantidade de pó que lhe removi.

Comecei a desfolhar.

Na segunda página lia-se, em letras bem grandes

"Capítulo 1: Gosto de ti porque...".


Como raio me teria aquilo escapado da primeira vez? Ainda por cima letras tão grandes...
Página seguinte... Fiquei perplexo.

1.º, 07 de Abril de 2007, 02:51
... quando tu não estás o ar fica mais pesado e por mais que arfe, nunca parece chegar.

2.º, 08 de Abril de 2007, 05:53
... ao adormecer sem ti sinto-me como quando era criança e tinha medo dos monstros que viviam debaixo da cama.

3.º, 08 de Abril de 2007, 05:57
... passei demasiado tempo a dizer a mim mesmo que não gostava de ti... e no fim continuei a gostar.

4.º, 08 de Abril de 2007, 06:07
... quando acordo de um pesadelo a meio da noite, não te consigo acordar... fico apenas a olhar para ti e a sorrir, por te ter ali, a dormir ao meu lado, com o teu ar inocente... como se o mundo rodasse e nada te conseguisse tocar.
E não te consigo acordar...

5.º, 08 de Abril de 2007, 06:11
... estava escrito nos átomos.

6.º, 08 de Abril de 2007, 15:31
... o teu olhar ensonado é o melhor "bom dia" que poderia ter.

"MAS QUE MERDA É ESTA?!"

Foi mais ou menos assim a exclamação uníssona que se soltou nas múltiplas personalidades que cá moram, por uma vez todas completamente de acordo.

A porta atrás de mim abriu-se. Como quem comete um crime ingénuo, apressei-me a voltar a enfiá-lo no meio de toda a confusão daquela mesa de trabalho.

terça-feira, agosto 14, 2007

Acabou!

Não consigo mais!

Quero ser filho de Pais Ricos!...
A sério!
Estou farto!...

António José Trindade

sexta-feira, agosto 03, 2007

Profissoes...

Somos todos Prostitutas nesta vida.
È uma verdade incondicional, e inquestionável. A um certo nível, todos nos prostituímos. De uma certa forma, mais berrantes ou mais discretos, todos nós temos em nós essa que é chamada a Profissão mais antiga do mundo..

Porquê esta conclusão?
Uma coisa engraçada na sociedade portuguesa hoje em dia, é que em 80% dos estabelecimentos (eu diria 95%, mas não quero soar a cínico), 80% dos estabelecimentos, estão ligados diáriamente às 3 estações "principais" da TV pública, sejam elas a RTP, a Sic e a TVI.
E entre os vários programas de entretenimento que existem para entreter os velhinhos, os que nada têm pra fazer da vida, os jovens que ficam ainda mais parvos, o cochichar da vida dos outros, as mensagens em rodapé, com letras grandes e berrantes a dizer: "AMO-TE mais que tudo. Ass Filipa" ou o riso histérico do/a apresentador/a...
Perdemos a noção da vida, e abraçamos tudo o que nos roube um pouco de neurónios...
Fiquei "ofendido" quando num destes canais, num programa de entretenimento que considero Lixo televisivo, um Actor por quem tinha o maior respeito, e admiração por trabalhos seus prévios, entrou no referido programa para fazer a secção de humor.
O Facto de ele fazer a secção de humor, não me afectou muito, porque ele sabe como fazê-lo, e era uma das razões pelo qual sempre o achei distinto de outros...
Perturbou-me a maneira como o fez.. com óculos de sol cor-de-rosa, com um vestido feminino de cores berrantes rasgado a mostrar as cuecas, com as bochechas e os lábios pintados de vermelho, com malinhas ao ombro, com sapatos de saltos altos...
Eu sei que a vida está mal, que o mercado aperta, todo aquele clima de "terror económico" que nos assola a mente todos os dias mas...
Estarêmos assim TÂO desesperados por trabalho, ao ponto de aceitarmos fazer figuras destas, em frente a milhares e milhares de pessoas?

Como vos disse... Sômos todos Prostitutas nesta vida...
A diferença é que uns abrem mais as pernas que outros ;)

António José Trindade

quarta-feira, agosto 01, 2007

O livro

Enquanto vasculhava nas recordações há muito perdidas de gerações infindáveis prévias à minha, encontrei um livro antigo.

Na verdade encontrei muitos livros mas este tinha algo de diferente. O toque, a decoração... como nos filmes, quando se pega no livro mágico e passa uma brisa de vento que levanta a poeira e confere aquele ar misterioso à cena.

Mas essa brisa não me despenteou nem levantou poeira.

Ao passar a mão pela capa desvendei o título mais estranho que alguém poderia ter dado a um livro: "O livro de tudo aquilo que já foi sentido mas nunca foi dito nem escrito".

"??!!"

Não tinha autor, não tinha data, não tinha prefácio nem dedicatória. Era simplesmente aquilo. Capa castanha escura de couro com relevos mais escuros, título e um monte de páginas sem texto, que nem sequer estavam numeradas.

"Faz sentido... se nunca foi escrito" - trocei eu daquele obtuso exemplar.


No entanto não me consegui vir embora sem ele...